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Artigo
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DOS BANCOS
DE DADOS POR INSERÇÃO INDEVIDA
Gilberto Antonio Medeiros
Advogado em São Paulo.
Especialista em Direito Empresarial e Direito Processual Civil.
Professor de Direito Processual Civil.
Mestrando em Direito das Relações Sociais pela
Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP.
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SUMÁRIO:
1. Introdução; 2. Aplicabilidade
do Código de Defesa do Consumidor à questão
em estudo; 3. Os bancos de dados e o Código de Defesa do
Consumidor; 4. O relacionamento entre consumidor e banco de dados;
5. Da necessária comunicação prevista no §
2º do art. 43 do CDC; 6. Da responsabilidade objetiva do Serasa
e da configuração do dano moral; 7. Os danos morais
e o Código de Defesa do Consumidor; 8. Conclusão;
9. Bibliografia.
1. Introdução
Como sabemos, o objetivo dos bancos de dados
de proteção ao crédito (SERASA, SCPC e outros)
é o de informar aos seus usuários, habitualmente fornecedores
de produtos e/ou serviços, a existência de alguma restrição
ao crédito daquele que está sendo objeto da consulta,
auxiliando na decisão de concessão ou não de
crédito.
Em decorrência, é notória
a conseqüência devastadora causada àquele que
tem seus dados inseridos nos referidos órgãos: abalo
ao crédito e à imagem, negativa de se obter talões
de cheques junto às instituições financeiras,
impossibilidade de se participar de licitações (no
caso da pessoa jurídica) etc.
Esta conseqüência é ainda
mais devastadora quando se trata de inserção indevida,
posto que além de causar eventual dano patrimonial, decorrente
do abalo ao crédito, causará também dano moral,
decorrente da afronta aos direitos fundamentais da personalidade,
notadamente o direito à privacidade e à honra, previstos
que estão no art. 5º, incisos X e XII da Constituição
Federal.
É por este motivo, pois, que o Código
de Defesa do Consumidor (norma que regula a atividade dos bancos
de dados) impõe, em seu art. 43, § 2º, a obrigatoriedade
legal de se proceder a comunicação, expressa, e por
escrito, àqueles que terão seus dados incluídos
nos arquivos de proteção ao crédito. A lei
não contém palavras inúteis, assim, a intenção
do dispositivo em comento é propiciar a ciência, ou
seja, o acesso aos dados, e a retificação de dados
incorretos, seja pela via extrajudicial ou pela via judicial (habeas
data Lei nº 9.507/97 —, ação desconstitutiva
etc.).
A finalidade da norma estatuída no §
2º do art. 43 do CDC é justamente dar a oportunidade
àquele que terá seu nome incluído no banco
de dados de proteção ao crédito, para que tome
as devidas providências, caso assim deseje.
Ocorre que a questão em estudo, embora
deva ser analisada sob o ótica do Código de Defesa
do Consumidor, que regula, como vimos, a atividade dos bancos de
dados, invariavelmente vem sendo analisada — a nosso ver de forma
errônea — sob a ótica do Código Civil.
Assim, o presente trabalho visa, de forma sucinta,
fazer uma análise sobre a aplicabilidade do Código
de Defesa do Consumidor para decidir sobre inserção
em bancos de dados de proteção ao crédito,
e sobre a responsabilidade objetiva destes órgãos,
quando esta inserção for indevida.
2. Aplicabilidade do Código de
Defesa do Consumidor à questão em estudo
O Código de Defesa do Consumidor define
consumidor stricto sensu no art. 2º, como "toda aquela
pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto
ou serviço como destinatária final". Esta definição
é bastante objetiva, mas pode e deve ser ampliada, para que
o conceito de consumidor seja estendido não somente àqueles
que adquirem ou se utilizam de produto ou serviço, como destinatário
final, como também àqueles que participem direta ou
indiretamente de uma relação de consumo, e àqueles
equiparados a condição de consumidor.
A definição de consumidor inserta
no art. 2º do CDC traz uma maneira, não de limitar,
mas de abrir à amplitude o leque de atuação
dessas novas regras. O consumidor, para fins de um contrato, não
será apenas aquela pessoa que diretamente pactuou, mas também
tornando-se assim o destinatário final do produto ou do serviço
colocado no mercado de consumo.
O contrato de consumo pelo CDC abrange não
somente uma nova concepção axiológica, mas
resguarda e se atenta aos efeitos do contrato, buscando assim uma
concepção social de cada pacto, e protegendo os vários
interesses ali envolvidos. Assim, quando a proteção
da Lei nº 8.078/90 estabelece que, para os efeitos da responsabilidade
pelo fato do produto e do serviço, tal como está no
art. 17, se equiparam aos consumidores todas as vítimas do
evento, este dispositivo deve ser visto pelo viés do direito
substancial, e pelos seus reflexos no processo civil.
Na mesma linha de raciocínio e de aplicação
dos princípios insertos no CDC, está o art. 29 que
abre o Capítulo V, que trata das práticas comerciais,
dispondo nos mesmos moldes do art. 17 que se acham em grau de equivalência
ao consumidor, as pessoas determináveis, ou não, desde
que expostas às práticas nele previstas. Em qualquer
dessas situações importa tão somente o terceiro
tenha sido atingido por conta de produto ou serviço defeituoso,
ou mesmo pela prática comercial irregular, prescindindo-se
de qualquer atuação ativa.
É o superamento da barreira do contrato,
que estaria a vincular apenas seus intervenientes, tornando esta
ampliação do conceito de consumidor um lenitivo para
tratar a massificação na qual se vê enredada
uma enorme gama de pessoas, em muitos casos deixados ao desamparo.
Naturalmente que a ampliação deste conceito no que
toca ao direito substancial encontra repercussões no Processo
Civil, e em especial na questão da legitimidade para agir.
Com efeito, a primeira questão que assoma
é a relativa ao fato de que estas pessoas se reputam consumidores,
não obstante não terem participado diretamente de
uma relação contratual. Assim como é irrelevante
que este terceiro, seja ou não destinatário final
do produto ou do serviço, para fins de enquadramento legal,
basta que seja vítima do evento.
Acentua-se desse modo que a responsabilidade
de que se tratará possui índole extracontratual. Porém,
para o CDC, é indiferente se a referência à
responsabilidade tenha aquele caráter, ou se vincula à
existência de um prévio contrato, pois que esta dicotomia
foi abolida, em favor de uma responsabilidade sem culpa ou objetiva.
Ou seja, àquele que é equiparado
legalmente ao consumidor bastará provar no seu processo o
dano de que foi vítima, o eventus damni e o nexo de causalidade
entre este prejuízo e o ato ou omissão do fornecedor
- facultando-se a este fornecedor utilizar-se das causas de exclusão
de responsabilidade, no caso em relevo, as circunstâncias
previstas no art. 14, § 3º, do CDC -, para que transfira
ao fornecedor o ônus de provar a exclusão de sua responsabilidade
objetiva.
Vale lembrar que ao terceiro equiparado ao
consumidor, aplica-se todas as benesses previstas no CDC a este
último.
Esta é, ao nosso ver, a única
interpretação eficaz e harmônica aos comandos
insertos nos arts. 17 e 29 do CDC, pois, de outra forma, não
haveria qualquer razão de ordem lógica, jurídica
e teleológica para tais preceitos.
Em decorrência, entendemos que aquele
que tem seus dados inseridos indevidamente nos bancos de dados dos
órgãos de proteção ao crédito
é terceiro equiparado a consumidor, na forma prevista no
art. 17 do CDC, motivo pelo qual a matéria deve ser analisada
de acordo com a norma consumerista.
3. Os bancos de dados e o Código
de Defesa do Consumidor
Na atual era do consumismo em massa, os consumidores
e os fornecedores participam diariamente de inúmeras relações
de consumo, sujeitando-se ao sistema protetivo do Código
de Defesa do Consumidor. Desses relacionamentos podem surgir acidentes
ou eventos danosos, causadores de prejuízos morais ou patrimoniais
reparáveis.
Vale exemplificar a atualidade da temática:
compras em supermercados, viagens, fruição de serviços
públicos, internações em hospitais, integração
de planos de saúde, efetivação de operações
eletrônicas em instituições financeiras etc.
Todo esse arcabouço fático pode ocasionar danos de
natureza moral.
Nos entrelaçamentos pessoais e patrimoniais
em que se envolvem os entes personalizados, múltiplos são
os fatos geradores de danos. A evolução da tecnologia,
os contínuos negócios privados, as infindáveis
maquinações da inteligência humana e outras
tantas atuações podem atingir e danificar esferas
jurídicas.
No que concerne à prestação
de serviços, outra situação muito debatida
atualmente, e ensejadora de possível dano moral, é
a inclusão indevida de nome de consumidores em bancos de
dados, cuja atividade está prevista no art. 43 do CDC. O
constrangimento e as situações vexatórias decorrentes
da "negativação" indevida merecem total
reparação. Aliás, a regra é a plena
reparabilidade de qualquer dano, em razão do princípio
natural do "neminem laedere", bem como em face da indistinção
legal.
A evolução das comunicações
pode ser verificada nas atividades desenvolvidas pelos bancos de
dados, que conseguem disponibilizar informações para
públicos infinitos.
Vem ganhando destaque esse tema no Judiciário
brasileiro, em face das restrições creditícias
e gravames que são impostos aos consumidores. Aumenta diariamente
o número de pleitos indenizatórios cumulados com pedidos
de exclusão dos nomes desses cadastros, em razão das
violações que causam as inclusões indevidas,
gerando dor, desprestígio, redução ou diminuição
de patrimônio, desequilíbrios etc.
4. O relacionamento entre consumidor
e banco de dados
O ilícito pode constituir-se de ação
ou de omissão contrária a um dever do ordenamento
jurídico, estipulado em lei ou contrato, imputável
ao agente, que causa prejuízo a outrem, pelo alcance de elementos
pessoais, morais ou patrimoniais do lesado.
O caso em estudo trata de inserção
indevida em bancos de dados de proteção ao crédito.
Assim, não há qualquer contrato anteriormente estipulado
entre aquele que sofre o dano e o órgão causador do
dano, o que permite compreender que a indenizabilidade seria caracterizada
por inobservância de normas e de princípios do ordenamento
legal, e não de inexecução de obrigações
contratualmente assumidas.
Por oportuno, importante se faz deixar claro
que não procede qualquer intuito de desqualificar o regramento
jurídico dos bancos de dados de consumo sob o argumento contratualístico,
isto é, de que inexiste relação jurídica
contratual entre eles e o consumidor-vítima. É verdade,
mas exatamente por isso mais se justifica a intervenção
legislativa, pois, sem o manto protetório do contrato, o
consumidor vê sua idoneidade financeira ser objeto de cadastro
e qualificação, ausente qualquer manifestação
sua de consentimento, comumente à sua revelia e até
contrariando sua vontade expressa.
A tutela jurídica do consumidor, sabe-se,
não é exclusiva ou sequer fundamentalmente contratual.
Ao revés, trata-se de sistema protetivo que atua antes, durante
e depois da contratação; e também nos casos
onde, embora não haja uma contratação efetiva,
a vítima se equipara ao consumidor (art. 17 do CDC).
É equivocado, portanto, querer fazer
coincidir os campos de atuação da relação
jurídica de consumo e da relação contratual
de consumo. Aquela é gênero, da qual esta é
espécie. Uma é o todo; a outra, a parte.
Isso quer dizer que, no que se refere aos bancos
de dados, o consumidor é sempre tutelado, ainda que se trate
de situação posterior à formação
do contrato ou até quando nem mesmo contratação
original de consumo existiu, como nos casos em que a doutrina alienígena
denomina de "bystander", para os terceiros que, embora
não mantenham relação de consumo direta com
o fornecedor, são afetados diretamente por fato ou defeito
do produto ou serviço, equiparando-se, pois, à figura
do consumidor.
Pode-se explicitar a diferenciação
da seguinte maneira: "Ante o conceito, atrás esboçado,
tem-se, desde logo, idéia de que a responsabilidade civil
se classifica em duas grandes espécies: a primeira, que se
situa no âmbito da inexecução de obrigação
contratada, chamada responsabilidade contratual; a segunda, posicionada
no inadimplemento normativo, ou seja, descumprimento de obrigação
contida na norma, cognominada responsabilidade extracontratual".
5. Da necessária comunicação
prevista no § 2º do art. 43 do CDC
O § 2º do art. 43 do CDC deixa clara
a obrigatoriedade legal de comunicar-se ao consumidor que seu nome
será incluído nos arquivos de proteção
ao crédito. A intenção da lei é propiciar
a ciência, ou seja, o acesso aos dados, e a retificação
de dados incorretos, seja pela via extrajudicial ou pela via judicial
(habeas data Lei nº 9.507/97 -, ação desconstitutiva
etc.)
A finalidade da norma estatuída no §
2º do art. 43 do CDC é justamente dar a oportunidade
àquele que terá seu nome incluído no banco
de dados de proteção ao crédito, para que tome
as devidas providências, caso assim deseje.
Assim, a ausência de comunicação
expressa do consumidor acarretará a efetivação
do dano, passível de reparação.
É que a responsabilidade dos bancos
de dados é objetiva, a teor do que dispõe o art. 14
do CDC, sendo sua a obrigação de comprovar a excludente
da responsabilidade, conforme define seu § 3º.
Ora, não se trata de mera informação
pública dos bancos de dados, mas sim de responsabilidade
civil destes — fornecedora de serviços —, que se utilizando
de sua atividade empresarial, propagam a informação
a toda a coletividade. E todos sabemos as conseqüências
funestas de ser ter o nome nos cadastros dos órgãos
de proteção ao crédito.
A finalidade da norma estatuída no §
2º do art. 43 do CDC é justamente dar a oportunidade
àquele que terá seu nome incluído no banco
de dados de proteção ao crédito, para que tome
as devidas providências, caso assim deseje. Não sendo
informado, será suprimido seu legítimo direito.
6. Da responsabilidade objetiva dos bancos
de dados e da configuração do dano moral.
O Código de Defesa do Consumidor consagrou
a responsabilidade objetiva do fornecedor, sendo desnecessária
a prova do ato culposo para que este seja objeto de indenização.
Essa evolução demonstra a tendência atual de
facilitação da defesa do consumidor hipossuficiente,
que nem sempre está munido e capacitado para provar que a
empresa prestadora de serviços atuou com culpa.
A Profª Maria Helena Diniz bem leciona
a respeito do tema, assim afirmando: "Como em certos casos
a teoria da culpa, que funda a responsabilidade civil na culpa,
caracterizada como uma violação de um dever contratual
ou extracontratual, não oferece solução satisfatória,
devido, p. ex., aos progressos técnicos, que trouxeram um
grande aumento de acidentes, a corrente objetivista desvinculou
o dever de reparação do dano da idéia de culpa,
baseando-o no risco com o intuito de permitir ao lesado, ante a
dificuldade da prova da culpa, a obtenção de meios
para reparar os danos experimentados. Assim, o agente deverá
ressarcir o prejuízo causado, mesmo que isento de culpa,
porque sua responsabilidade é imposta por lei independentemente
de culpa e mesmo sem necessidade de apelo ao recurso de presunção".
Depreende-se que o dever de ressarcir, legalmente
estabelecido, ocorre sempre que se verificar a autoria de um fato
lesivo, sem necessidade de indagações sobre contrariedade
ou não a normas predeterminadas.
"Observe-se, assim, que a constante objetivação
de base na teoria do ressarcimento, a fim de atender-se a reclamos
de justiça, frente a complexa organização social
que impera no mundo presente onde aparatos tecnológicos
perigosos convivem com seres humanos, em todos os espaços
, pode conduzir, no futuro, a matéria a novas e diversas
concepções, com a automática reparação
dos danos (como, por exemplo, a submissão do lesante a prestações
sociais alternativas como reparação)."
No caso em estudo, resta clara a responsabilidade
objetiva dos bancos de dados de proteção ao crédito.
Ora, ao se descumprir a norma prevista no § 2º do art.
43 do CDC, agiu diretamente contra o consumidor equiparado, sendo
sua responsabilidade aquela prevista no art. 14 da norma consumerista.
Vale lembrar aqui a "capacidade destruidora" dos bancos
de dados.
Por fim, temos ainda que restará configurado
o dano moral causado ao consumidor equiparado. É que os danos
resultantes da inclusão indevida do nome de alguém,
por exemplo, no Serasa, podem ser patrimoniais ou morais; os patrimoniais
exigem prova do prejuízo, os morais resultam ex re ipsa,
isto é, exsurgem da situação, sendo, pois,
a reparação fixada pelo juiz, independentemente de
prova efetiva do prejuízo — o prejuízo moral tem presunção
hominis de existência, isto é, para o não reconhecimento
de sua existência deve haver a prova em contrário.
À propósito, o entendimento de
nossos tribunais quanto a responsabilidade objetiva dos bancos de
dados de proteção ao crédito, e quanto a configuração
do dano moral, em casos análogos ao aqui tratado, não
tem sido outro. Confira-se:
"Consumidor. Recurso Especial. Inscrição
no cadastro de inadimplentes. Comunicação prévia
do devedor. Necessidade. Dano moral. Configuração.
A inscrição do nome do devedor no cadastro de inadimplentes
sem a sua prévia comunicação por escrito ocasiona-lhe
danos morais a serem indenizados pela entidade responsável
pela manutenção do cadastro. Nesse caso, demonstra-se
o dano moral pela simples comprovação da inclusão
indevida. Precedentes" (STJ, REsp nº 442051/RS, 3ª
Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 17/02/2003)
"Direito do Consumidor. Inscrição
indevida no SPC. Furto de cartão de crédito. Dano
moral. Prova. Desnecessidade. Comunicação ao consumidor
de sua inscrição. Obrigatoriedade. Lei 8.078/90, art.
43, § 2º. Doutrina. Indenização devida.
Fixação. Precedentes. Recurso parcialmente provido.
I Nos termos da jurisprudência da Turma, em se tratando
de indenização decorrente da inscrição
irregular no cadastro de inadimplentes, a exigência de prova
de dano moral (extrapatrimonial) se satisfaz com a demonstração
da inscrição irregular nesse cadastro. II De
acordo com o artigo 43, § 2º do Código de Defesa
do Consumidor, e com a doutrina, obrigatória é a comunicação
ao consumidor de sua inscrição no cadastro de proteção
de crédito, sendo, na ausência dessa comunicação,
reparável o dano oriundo da inclusão indevida. III
É de todo recomendável, aliás, que a
comunicação seja realizada antes mesmo da inscrição
do consumidor no cadastro de inadimplentes, a fim de evitar possíveis
erros, como o ocorrido no caso. Assim agindo, estará a empresa
tomando as precauções para escapar de futura responsabilidade.
IV Não se caracteriza o dissídio quando os
arestos em cotejo não se ajustam em diversidade de teses."
(STJ, REsp nº 165727/DF, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio
de Figueiredo Teixeira, DJ 21/09/1998)
"SERASA. Comunicação prévia.
Falta. Indenização. A falta de comunicação
da inscrição do nome do devedor no banco de dados
de inadimplência gera direito à indenização
pelo dano extrapatrimonial que daí decorre. Recurso conhecido
e provido." (STJ, REsp nº 448010/SP, 4ª Turma, Rel.
Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ 10/03/2003)
Por todo o exposto acima resta-nos claro, pois,
a responsabilidade objetiva dos bancos de dados de proteção
ao crédito, na forma estatuída pelo art. 14 do CDC,
por inobservância do quanto previsto no art. 43, § 2º,
do mesmo estatuto, cabendo a ela o ônus de provar a excludente
de sua responsabilidade.
7. Os danos morais e o Código
de Defesa do Consumidor
A relevante postura da reparabilidade de danos
morais, adotada pelo Código de Defesa do Consumidor em seu
art. 6º, VI, representou firme orientação do
legislador na defesa dos valores íntimos da personalidade.
Na definição do Prof. Carlos
Alberto Bittar, morais são "os danos experimentados
por algum titular de direitos, seja em sua esfera de consideração
pessoal (intimidade, honra, afeição, segredo), seja
na social (reputação, conceito, consideração,
identificação), por força de ações
ou omissões, injustas de outrem, tais como agressões
infamantes ou humilhantes; discriminações atentatórias;
divulgação indevida de fato íntimo; cobrança
vexatória de dívida e outras tantas manifestações
desastrosas que podem surgir no relacionamento social".
Os danos morais são lesões sofridas
por alguém, em componentes básicos de sua personalidade,
por fato antijurídico de outrem, que devem ser reparadas,
sem qualquer balizamento temporal, dada a natureza dos bens jurídicos
em questão.
Em seqüência à constitucionalização
do princípio da proteção aos direitos fundamentais
da pessoa humana (CF, art. 1º, III) e especialmente em face
da reparabilidade dos danos morais constitucionalmente assegurada
(CF, art. 5º, X), o Código de Defesa do Consumidor,
em seu art. 6º, demonstrou igualmente seu interesse no que
pertine às relações de consumo.
8. Conclusão
Por todo o exposto concluímos que deve
ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor nos casos que
envolvam a inserção de dados nos órgãos
de proteção ao crédito, e que se opera a responsabilidade
objetiva destes órgãos, quando esta inserção
for indevida.
É que embora o consumidor equiparado
não mantenha uma relação de consumo direta
com os bancos de dados de proteção ao crédito,
é equiparado a um consumidor, por força do que preconiza
o art. 17 do Código de Defesa do Consumidor, ampliando o
conceito de consumidor para abranger também a situação
do cognominado bystander, como tal entendido aquele que, inobstante
não mantenha uma relação direta com o fornecedor
de produtos ou serviços, possa vir a ser afetado por fato
ou defeito do produto ou do serviço, pelo que a solução
de eventual litígio deve, sem dúvida, ser disciplinado
pelo aludido diploma legal.
Superada tal questão, resta patente
a responsabilidade objetiva dos órgãos de proteção
ao crédito. Primeiro porque é regra geral do CDC,
fundada na teoria do risco da atividade; e segundo porque há
previsão expressa no art. 14 do referido diploma.
Demonstrado a responsabilidade objetiva dos
bancos de dados de proteção ao crédito, certo
é que incumbe à estes a comprovação
da excludente de sua responsabilidade, conforme comando legal estatuído
pelo art. 14, § 3º, do CDC.
Resta claro, pois, que a "negativação"
sem a devida observância do quanto disposto no art. 43, §
2º, do CDC (comunicação por escrito), caracterizar-se-á
como indevida, passível, pois de reparação.
Quanto à existência do dano, tem-se
por presumido, uma vez que há muito vem sendo reconhecido
que "o injusto ou indevido apontamento no cadastro dos maus
pagadores do nome de qualquer pessoa que tenha natural sensibilidade
aos rumores resultantes de um abalo de crédito produz nessa
pessoa uma reação psíquica de profunda amargura
e vergonha, que lhe acarreta sofrimento e lhe afeta a dignidade.
Essa dor é o dano moral indenizável e carece de demonstração,
pois emerge do agravo de forma latente, sofrendo-a qualquer um que
tenha o mínimo de respeito e apreço por dignidade
e honradez"
A propósito, já asseverou o Des.
Cezar Peluso que "o descrédito econômico, enquanto
perda da confiança pública na capacidade de cumprir
as obrigações negociais, é, na sociedade capitalista,
pesada ofensa à honra".
Assim, ao nosso ver, resta clara a responsabilidade
objetiva dos bancos de dados de proteção ao crédito
por eventual inserção indevida em seu banco de dados,
assim como sua obrigação de indenizar o dano causado,
a teor do que dispõe o art. 6º, VI, do CDC.
9. Bibliografia
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RDC 36/45, São Paulo: RT, outubro-dezembro/2000.
BENJAMIN,
Antonio Herman de Vasconcellos e. Código Brasileiro
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ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.
BITELLI, Marcos
Ablerto Santanna. Obrigação de Retificação
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BITTAR, Carlos
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DINIZ, Maria
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NERY JÚNIOR,
Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo
Civil Comentado e Legislação Processual Civil em Vigor,
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NERY JÚNIOR,
Nelson. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor
comentado pelos autores anteprojeto, 6ª ed., Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 1999.
PAULA, Adriano
Perácio de. Direito Processual do Consumo. 1ª
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